quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Complexo dos Perdigões tem 1500 anos de Pré-História ...

Fornos com 5500 anos e um sistema circular de pedras com 4000 anos estão contidos num pequeno rectângulo com 15 metros de comprimento. No Complexo Arqueológico dos Perdigões, em Reguengos de Monsaraz, no Alentejo, é possível olhar para estas estruturas, que correspondem a um período de 1500 anos, sem sair do mesmo local. Este é um importante resultado das explorações arqueológicas no recinto, a cargo da empresa Era-Arqueologia, e que foi possibilitado graças ao uso de uma prospecção geofísica, técnica que permite fazer uma espécie de radiografia ao terreno.

A sondagem, feita no âmbito do projecto de colaboração com a Universidade de Málaga, levou a que se percebesse que uma mancha escura, já visível no território da Herdade do Esporão nas fotografias aéreas, correspondia a uma estrutura circular feita de pedra com um diâmetro compreendido entre os 15 e os 20 metros e que data, possivelmente, do final do 3.º milénio a.C., ou seja, tem cerca de 4000 anos, pertencendo, assim, ao período Calcolítico.

No entanto, a geofísica apenas "disponibiliza" a imagem, não dando informações concretas sobre o que se vê na mesma. Ainda assim, os resultados preliminares da "radiografia" levaram a que se começasse a trabalhar nessa parte do terreno, para ser possível perceber a dinâmica de evolução do uso do território. Como consequência, já está a descoberto uma pequena parte desse sistema de pedra no tal rectângulo com os tais 15 metros de comprimento.

Mesmo ao lado das pedras podem ser vistos depósitos e estruturas também do Calcolítico, mais precisamente de há 5000 anos. Na extremidade oposta ao sistema circular encontram-se alguns fornos que se presumem ser de há 5500 anos, do Neolítico Final. A prospecção geofísica permitiu ainda descobrir algumas valas que parecem corresponder a paliçadas, construções constituídas por troncos de madeira.

António Valera, o responsável pelo Núcleo de Investigação Arqueológica, uma área de investigação e desenvolvimento da Era-Arqueologia, mostra-se entusiasmado com a possibilidade de num só espaço poder "estudar um longo período de ocupação" e de, igualmente, ser possível "começar a caracterizar algumas das estruturas [existentes] ".

Espaço onde se podem ver vestigíos com 1500 anos de intervalo
Foto de Raquel Esperança


Preservação assegurada

O complexo arqueológico começou a ser explorado em 1997, um ano depois de se ter percebido a extensão da sua riqueza pré-histórica, após se terem cancelado os trabalhos para se plantar uma nova vinha na Herdade do Esporão, pertencente a José Roquette. Dois terços do complexo estão localizados nesta herdade e são classificados como "reserva arqueológica". O restante espaço encontra-se situado noutros terrenos, mas está sob várias condicionantes, o que dá garantias em relação à preservação do recinto. Além disso, o complexo dos Perdigões tem vantagens de exploração porque não está sob outras construções, como acontece a outros antigos povoados, que mesmo tendo uma maior dimensão do que este não podem ser explorados na sua totalidade.

Já a rede de rega do Alqueva tem feito aparecer zonas com grande interesse arqueológico no Alentejo, que têm conduzido à ideia de que as chamadas "sociedades pré-históricas" são, afinal, mais complexas do que o que se pensava anteriormente.

Miguel Lago, o director da Era-Arqueologia afirma, em relação ao estudo nos Perdigões, que o projecto é "de várias gerações", pois diz que, em poucos anos, não é possível desvendar o "enorme potencial" do recinto.

Essa demora no ritmo de investigação só é possível, segundo Miguel Lago, por ser um projecto privado. Financiado pela Era-Arqueologia, pelo Esporão e pela Sociedade Alentejana de Investimento e Promoção e ainda com o suporte logístico assegurado pela Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz, esta pesquisa não sofre pressões de âmbito comercial, o que facilita a adopção dessa "dinâmica diferente". Os interessados na investigação são, normalmente, académicos da área que respeitam directrizes científicas e é com base nas suas análises que poderá ser conseguida uma maior credibilidade para o complexo, tornando possível a continuação da aposta nesse ritmo diferente.

Nesse sentido, o trabalho levado a cabo pelo Departamento de Pré-História da Universidade de Málaga, encabeçado por José Márquez Romero, deverá apresentar resultados definitivos da investigação feita num fosso a nordeste do recinto, no início do próximo ano. Para já, foram descobertos cornos de bovino e mandíbulas de porco na sua escavação, onde, ao longo dos anos, têm sido encontrados outros restos de fauna, segundo disse Miguel Lago. A equipa espanhola ambiciona descobrir se o enchimento desse fosso desde a sua abertura decorreu de forma natural e aleatória, ou se, de outra maneira, resultou de uma acção ritual dos povos que habitavam a área.

Estes artefactos agora conhecidos juntam-se assim, por exemplo, a uma mandíbula humana ou a figuras zoomórficas, como uma minúscula forma milenar de um coelho, presentes no museu arqueológico da herdade.


In: Público
13.08.2009 - 10h00
Diogo Cavaleiro

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